Indústria do cinema com Verão escaldante
As notícias mais recentes do mercado audiovisual internacional, e afirmações dos executivos , indicam que o verão promete ser bem escaldante!
A fusão Paramount / Skydance
A relação com os financiadores da Paramount complicou-se devido à ascensão das plataformas de streaming, à pandemia mundial e mais recentemente com as duas greves de Hollywood, que limitaram os conteúdos audiovisuais.
Depois de semanas de disputa entre os nomes gigantes do audiovisual “made in Hollywood”, chega a notícia que haverá fusão entre a Paramount e a Skydance, num negócio avaliado em 8 mil milhões de dólares.
O negócio, que aguarda aprovação do acionista Shari Redstone, dono da National Amusements que possui 77% das principais acções da empresa, será o culminar de um processo que tem feito Hollywood tremer devido à saúde financeira deste estúdio produtor de êxitos como Top Gun ou Star Trek.
Assim sendo, ter-se-á evitado o desaparecimento da mítica produtora Paramount; quando em disputa pelo negócio estavam companhias como Warner Bros. ou Sony Pictures.
A Inteligência Artificial na Sony Pictures
O CEO da Sony Pictures Entertainment (SPE), Tony Vinciquerra, em conversa com os investidores da empresa revelou que procuram métodos mais eficientes para produzirem conteúdos, nem que para isso recorram a Inteligência Artificial. Logo surgiram rumores do AranhaVerso recorrer à tecnologia da moda.
Mas, não se pense que serão produzidos conteúdos de forma descontrolada com recurso aos avanços tecnológicos. Os 8 meses de greves em Hollywood, por causa da Inteligência Artificial, e as negociações que aí começaram vão ditar as possibilidades futuras de utilização da tecnologia.
O objectivo da Sony passa por ter mais propriedade intelectual, mais conteúdos para os espectadores, e produtos para venda, com a aposta na Crunchyroll como principal impulsionador de crescimento da SPE.
A visão estratégica do cinema
Tom Rothman, CEO da Columbia Pictures (do grupo Sony Pictures), mantém a defesa do seu método tradicional. Que é como diz, quando as grandes empresas priorizavam a construção de serviços de streaming, ele defendeu transformar os filmes em entidades tangíveis e culturalmente relevantes através de um marketing apelativo que levaria a negócios de conteúdos, como o acordo da Sony com a Netflix. Negócio esse, que, aconteceu quando os principais estúdios tinham recusado entregar as novidades ao gigante do streaming mundial.
Em entrevista recente, Rothman, recordou que durante cem anos, através de inúmeros modelos de distribuição diferentes, com receio constante da extinção do sistema de estúdio, através da massificação da televisão e depois de outras formas de entretenimento doméstico, através do VHS, e depois da chegada de dezenas e dezenas canais de televisão por cabo ou por satélite, e da massificação dos filmes em disco e com qualidade de imagem e som superior, o certo é que os filmes perduraram.
E neste momento, de glorificação das plataformas de streaming, são os filmes de sucesso que se tornam mais valiosos.
O CEO da Columbia Pictures, por ocasião do 100º aniversário do estúdio Sony, disse que o cinema não está morto e não está prestes a morrer. Pelo contrário, disse que o streaming fez com que fosse novamente valorizado.
Na actualidade, o cinema compete com a televisão, com os dispositivos móveis e os videojogos, entre outros, para chamar a atenção dos jovens. A tarefa é bem complexa, já que a geração TikTok tem uma limitada capacidade de concentração dos conteúdos. Ou gosta ou desiste! O cinema, que exige pelo menos 90 minutos sem distrações, tem uma missão (quase) impossível com uma geração cuja mentalidade está configurada de forma diferente.
E, se nos últimos 15-20 anos, houve uma gigante aposta nas propriedades intelectuais com filmes sobre criações existentes, como adaptação de banda desenhada, jogos ou brinquedos, em breve isso poderá ser bem diferente.
Um dos motivos que pode explicar a queda na venda de bilhetes é o excessivo empenho de Hollywood em fazer filmes baseados em sagas, novas versões, continuidades e prequelas. E compreende-se a decisão recente dos estúdios, já que o espectador foi investindo o seu dinheiro e atenção em ver o desenvolvimento daquela história ou personagem. Acabando por não aplicar o dinheiro em filmes desconhecidos.
O cinema evento
O resultado dos estúdios nesta década já passou pela aposta no cinema evento, que dá continuidade a sucessos como aconteceu com Homem-Aranha: Sem Volta a Casa, Top Gun: Maverick ou Avatar: O Caminho da Água, em que o espectador considerou que seriam títulos obrigatórios para assistir nos cinemas e posteriormente recordar em casa.
A solução, que começa a ter resultados admiráveis, passa por criar filmes que sejam culturalmente imperativos, e exemplo disso foi a estreia no mesmo dia do ano passado de duas obras de cineastas com invulgar visão de arte, como Oppenheimer e Barbie.
Na sua percepção, a indústria precisa de conteúdos novos, apesar dos riscos inerentes. Sendo que identifica que o problema bem maior será aborrecer o público até à morte. E Rothman define, que o objectivo da indústria seja oferecer filmes novos, com conteúdos que os espectadores ainda não tenham visto no grande ecrã.
Os falhanços nas bilheteiras
Este ano, os pretensiosos blockbusters de Hollywood vão se revelando desastrosos, nas bilheteiras por todo o mundo.
O cineasta Denis Villeneuve veio recentemente mostrar o seu desapontamento por chegar a junho e o seu filme Dune – Duna: Parte Dois continuar a ser um dos maiores sucessos dos cinemas neste ano. O cineasta canadiano espera que em breve as bilheteiras obtenham melhores resultados, reconhecendo a necessidade de filmes que sejam verdadeiras experiências cinematográficas.
O fracasso de Profissão: Perigo ganhou outra dimensão quando a Uiversal Pictures disponibilizou o filme em serviços de video-on-demand, apenas 14 dias depois da estreia nos cinemas norte-americanos. A Warner Bros. prepara-se para disponibilizar Furiosa: Uma Saga Mad Max, nos mesmos serviços, um mês após a estreia.
Profissão: Perigo foi orçamentado em 130 milhões de dólares e em todo mundo rendeu, até início de junho, 158 milhões de dólares de receita nas bilheteiras. Furiosa: Uma Saga Mad Max teve um orçamento de produção estimado nos 168 milhões de dólares, e nas bilheteiras de todo o mundo rendeu, até início de junho, 116 milhões de dólares.
Para o cineasta brasileiro Kleber Mendonça, a redução da janela de exibição exclusiva nos cinemas revela que, “O mercado é estúpido como uma porta. Se acha que vai ter fome, come a própria mão e depois o braço“, comentando ainda nas redes sociais “Eles são burros, não entendem de cinema, da história que fez esse business, são gente do setor imobiliário, ou de fertilizantes“.
Num outro sentido poderá já estar a Disney, que considera dilatar a janela de exclusividade de permanência em sala de cinema de Divertida-Mente 2. Fala-se que o filme demorará 100 dias a chegar a soluções de entretetenimento doméstico, como video-on-demand ou à plataforma Disney+.
A Disney pretenderá redimir-se da maneira como tratou os exibidores desde o início da pandemia global, tendo inclusive decidido estrear em salas de cinema seleccionadas na América do Norte os primeiros episódios de Star Sars: The Acolyte, série do Disney+.
Para Jim Morris, presidente do estúdio de animação Pixar, as decisões recentes da Disney em ignorar a estreia nos cinemas de Luca, Soul – Uma Aventura com Alma e Turning Red – Estranhamente Vermelho, mudou a mentalidade dos espectadores, que escolheram aguardar para assistir nos telemóveis, ou nas televisões, a outras produções como Lightyear ou até mesmo Elemental.
O executivo espera que nenhuma outra longa-metragem tenha estreia no Disney+, e se a Pixar desenvolver mais conteúdos para a plataforma de streaming, que seja através de séries. No entender de Morris, será uma maneira de demarcar entre o que Pixar faz para cinema e para consumo doméstico.
Os orçamentos milionários
O CEO da Columbia Pictures preocupado lembra que, Hollywood ainda não se apercebeu que embarcou num modelo de produção insustentável. Recorde-se que George Lucas e Steven Spielberg identificaram publicamente o problema das produções caríssimas em meados da década passada, vaticinando que a indústria poderia implodir após alguns desastres milionários em período de advento da “televisão por internet”, como assim chamaram em 2013 aos serviços de streaming.
Os estúdios produzem filmes cada vez mais caros, fruto da aposta desenfreada inflacionada por uma disputa de atenção do espectador e com dispendiosas campanhas publicitárias em torno de produtos que não apelam às grandes audiências.
(recorde aqui publicação sobre os avultados orçamentos dos último filmes da saga Indiana Jones e Velocidade Furiosa)
A indústria admira-se do sucesso de títulos como Todos Menos Tu, que gerou retorno do investimento e acumulou sucesso entre os espectadores (em Portugal continua a ser o líder das bilheteiras de 2024!). Produção de orçamento mediano, a comédia romântica acabou por agradar a diversos públicos.
Rothman não se esqueceu de referir a aposta dos estúdios em filmes com uma duração superior ao normal (1h40/2h), lembrando que um bom filme ou memorável, como Casablanca tem a duração de 1h42.
A solução para recuperar audiências
Regressando aos orçamentos dos filmes, os bilhetes de cinema acompanharam a escalada de preços de produção dos filmes.
O cinema deixou de ser a prioridade dos jovens. A juventude não vai ao cinema como iam outras gerações. Ou seja, para Rothman o próximo passo passa por reduzir o preço dos bilhetes de cinema para atrair os jovens e famílias, para quem levar quatro ou seis pessoas a uma sessão fica bastante dispendioso. (Contabilizando apenas a despesa com os bilhetes…!)
A Festa do Cinema, através do bilhete a preço inferior, passou a ser uma promoção para incentivar a ida ao cinema, e o sucesso aconteceu naturalmente em Portugal e em outros países onde vai acontecendo.
(partilhamos aqui análise aos números do evento de 2024).
Os exibidores e distribuidores vão sempre argumentar que o bilhete de cinema é bem mais barato que ir ao futebol ou a um festival de música ou concerto, mas para quem tem poucos recursos na carteira, ir ao cinema ficou caro!
(publicação actualizada a 5 de junho)
Horas depois da publicação deste artigo, coincidentemente, surgiu outra voz a alertar para o impacto na indústria cinematográfica dos preços praticados nas bilheteiras dos cinemas.
Quentin Tarantino alertou que o cinema não é para elites, insistindo que é uma arte popular e feita para ser acessível a todos.
Recordando, que, a ascensão do cinema e o sucesso da indústria ganharam popularidade principalmente porque qualquer pessoa podia assistir a um filme no cinema. O cineasta vem, desde 2016, a alertar para a escalada do preço dos bilhetes, ironizando que não se trata pagar para ver uma ópera ou peça de teatro. Para Tarantino, o cinema é arte para todos e a isso deve-se o sucesso da 7ª arte!
Começou a caminhar nos alicerces de uma sala de cinema, cresceu entre cartazes de filmes e película. E o trabalho no meio audiovisual aconteceu naturalmente, estando presente desde a pré-produção até à exibição.