Cinema: Crítica – Nem Respires (2016)
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Seria preciso muito para eu sequer conseguir ignorar a possibilidade de um Evil Dead IV e considerar o termo remake. Que outra pessoa poderia assumir a cadeira de realizador senão Sam Raimi? Que outra pessoa poderia vestir o queixo de Bruce Campbell?
A resposta veio na forma do uruguaio, Fede Alvaréz e do seu imparável comboio de gore, choque e carnificina que resultou numa das apostas mais doentias, corajosas e divertidas algumas vez lançadas por uma das grandes divisões de Hollywood – sendo quase necessário limpar os olhos depois de cada momento de violência reluzente e bem fotografada, que magicamente se conseguiu libertar para o Mundo assistir.
Como todos os pedaços deste enorme bolo chamado exploitation, Evil Dead não era para todos os gostos. E é com o meu próprio gosto que digo: muito menos é este Nem Respires.
Um grupo de adolescentes, Rocky (Jane Levy), Money (Daniel Zovatto) e Alex (Dylan Minnette) ganham a sua vida a assaltar regularmente casas em Detroit (aposto que não são os únicos!) usando a companhia de segurança do pai de Alex como a sua wishlist de casas.
Infelizmente, este grupo é composto pelos únicos três jovens à face da Terra que não viram o Avatar de James Cameron, logo não fazem a mínima ideia que não se deve meter com o Stephen Lang. Muito menos quando ele tem, pelo menos, $300,000 em casa e é cego.
A premissa do filme é, inicialmente, algo simples e pronta a ser moldada num genérico e simpático home invasion thriller, embora soando estranhamente familiar a Wait Until Dark – filme que valeu a Audrey Hepburn a sua última nomeação para o Óscar – Alvaréz revelou numa entrevista que foi a mãe que o pôs a par desta coincidência. Eu acredito.
Confesso nunca ter visto o thriller de 1968, mas duvido que se transforme no monstro deformado e grotesco que este Nem Respires é nas mãos de Fede Alvaréz e do argumentista Rodo Sayagues.
Os dois rolam esta verdadeira bola de tensão e suspense ao público como quem atira um novelo de lã a um gato, e se delicía a ver a sua genuína reacção. Excepto que nesta bola, estão alguns dos melhores jump scares que verão este ano.
E como se isto não bastasse, o filme corta a meio para caminhos honestamente tenebrosos e perturbadores que irão explodir em pleno no terceiro acto (que se perde em algumas explicações e motivações), apresentando-nos uma excelente sequência em visão nocturna, que nos relembra automaticamente todos aqueles pesadelos que Jonathan Demme nos deu com o seu Silence of the Lambs.
É uma regra de ouro, numa boa narrativa, deixar cair obstáculos para as nossas personagens ultrapassarem. Tal como em Evil Dead, Alvaréz deixa cair esses mesmo obstáculos não à frente das personagens, mas sim em cima delas, esmagando qualquer osso ou órgão que se ponha à sua frente, restando apenas no final uma abundante poça de sangue ou umas valentes nódoas negras.
Grande parte do filme é uma autêntica pinãta física e emocional nas personagens, que pode ser tão desgastante nelas como no próprio público – resultando numa experiência imperdoável e incessante para alguns (eu tinha um sorriso enorme na cara. Não faço a mínima ideia o que é que isso diz de mim).
Mas esse é precisamente o extremo que Alvaréz quer alcançar e ele fá-lo como ninguém – com um estilo mais preciso e mais elegante do que por exemplo, Alexandre Aja (se bem que elegância era algo que não faltava ao seu Maniac) – conseguindo injectar momentos tão repulsivos e imaginativos que só podem ser o equivalente a salpicos de comédia negra (se virem o filme, vão perceber exactamente do que é que estou a falar).
Sim, existem buracos gigantes que rasgariam facilmente a narrativa que o filme veste, mas concentrar-nos nesse aspecto seria redundante e inglório. Não que o filme não mereça melhor, mas o que nos oferece é de uma visceralidade tão grande, que estamos de barriga cheia ainda antes dos créditos finais começarem.
Antes de terminar, uma nota especial para Stephen Lang que lidera o ecrã com uma presença fenomenal e intimidante a cada segundo que se encontra no ecrã. Se o Mr. Magoo tivesse esta atitude, a sua vida teria sido extremamente diferente.
Este não é o vosso habitual filme de estúdio. Este nem é o vosso habitual filme de terror. Podem adorar. Podem odiar. Mas só há uma regra: Respirem! (porque senão, é difícil ver o filme. Especialmente morto).
PS: Nem Respires estreia nas salas a dia 8 de Setembro, mas podem apanhá-lo (se ainda houver bilhetes) já no dia 6 de Setembro, na sessão inaugural deste ano do MotelX.