Cinema: Crítica – Estados Unidos vs. Billie Holiday
Baseado num segmento do livro “Chasing the Scream”, de Johan Hari, Os Estados Unidos vs. Billie Holiday explora a perseguição por parte do governo norte-americano contra a popular cantora de jazz Billie Holiday, sobretudo Harry Anslinger, diretor do departamento contra narcóticos do FBI, que recorre a todo o tipo de truques para silenciá-la e impedi-la de cantar “Strange Fruit”, uma canção sobre os linchamentos de negros no sul do país.
Para Anslinger e outros membros do governo, Holiday era uma ameaça ao sistema estabelecido, pois entendiam que representava um incentivo à rebelião. Trata-se de um eufemismo para dizer que eram racistas que queriam manter as minorias subjugadas, nomeadamente a comunidade negra.
Com o seu talento, sucesso e atitude corajosa em palco, Holiday era um símbolo poderoso para o seu povo, uma defensora dos direitos civis à frente do seu tempo, admirada pelas massas, algo que Billie tinha em conta, ao mesmo tempo que reconhecia o impacto da sua canção, que fazia questão de interpretar em todas as suas atuações.
Infelizmente, o realizador Lee Daniels (O Mordomo) parece não entender a importância da história que quer contar. Ou, pelo menos, não lhe dá o foco necessário. Esta é uma daquelas histórias onde tudo acontece à protagonista, retirando-lhe o controlo do seu próprio caminho, enfraquecendo a sua posição, facto que se torna ainda mais frustrante quando se sabe o quanto Holiday lutou pelos valores em que acreditava.
Daniels preocupa-se em mostrar várias personagens e tenta passar a ideia do quão importante Billie e as suas canções foram para todos, mas raramente aprofunda a temática. O filme explora o seu vício em álcool e heroína, e os relacionamentos de Billie com homens que se aproveitam dela, especialmente Jimmy Fletcher (Trevante Rhodes), um agente do FBI designado para apanhá-la em flagrante com narcóticos, e a perseguição implacável de Anslinger. É como se Daniels se preocupasse mais em apresentar determinados momentos da vida de Holiday de uma forma mais antológica do que conectada, evitando um impacto emocional para além do demonstrado pelos atores.
Ainda assim, o filme acaba por funcionar essencialmente graças ao trabalho maravilhoso de Andra Day, que encarna a pele figurativa de Bilie, desde os seus maneirismos a cantar, a sua voz suja mas doce e o seu talento delicado, quase inocente, contrastando com a sua força no momento de defender o que era seu.
Esta é a última película da temporada de prémios sobre figuras proeminentes na história social negra dos Estados Unidos, após o excelente Uma Noite em Miami (disponível na Amazon Prime) e o extraordinário Judas e o Messias Negro. Lamentavelmente, este Estados Unidos vs. Billie Holiday revela-se o mais fraco do grupo, principalmente devido à inércia de Daniels em criar uma história envolvente e coesa, ficando a dúvida do resultado que poderíamos ter caso a película tivesse ido parar a mãos mais capazes.
Nota Final: 5,5/10
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