BD: Sandman regressa – Mais uma razão para ler a clássica série…
The Sandman #1 foi lançado em Janeiro de 1989 e para celebrar o seu 25º aniversário, a Vertigo vai lançar uma prequela escrita por Neil Gaiman e desenhada por J.H. Williams III. A primeira revista desta mini-série está prevista para 30 de Outubro e vai chamar-se The Sandman: Overture.
Da minha parte, a celebração começa já, com a nova leitura das 75 revistas desta série de culto dos anos 90. Posso começar por dizer-vos que as 20 revistas que li sobreviveram bem ao tempo! – Apenas tive um pequeno problema com a revista #19, intitulada “A Midsummer Night’s Dream” porque a sua história ocorre no século XVI e parte da revista é a transcrição da peça de teatro, com o mesmo nome, de William Shakespeare – o inglês antigo é intragável – infelizmente a revista é muito importante para o desenvolvimento da história e por isso tem mesmo que ser lida. De resto, William Shakespeare já tinha aparecido numa revista anterior. No #19 teve uma revista inteira dedicada a si e vai ter pelo menos mais uma aparição, na última revista deste título.
A vantagem de se ler uma série que está completa/terminada reside no facto de se conseguir perceber melhor onde o autor queria chegar quando a planeou. Além disso, não existe a ansiedade que por vezes se sente quando é necessário esperar um mês pela próxima parte da história que tanto queremos ler.
Quem segue a edição de comics norte-americana conhece os altos e baixos que este tipo de publicação mensal pode ter.
Todas as revistas têm muito texto, mas nada do que Neil Gaiman escreve é acessório ou irrelevante, há uma direcção clara e cada revista tem a sua pequena moral que depois se vai enquadrar no arco maior.
Gaiman, consegue pegar em qualquer tema e torná-lo acessível a qualquer leitor, de tal forma que conseguimos sentir aquela realidade sem qualquer pré-conceito.
É curioso notar a abertura a temas tão sensíveis como a morte, o inferno e a sexualidade.
Em 2013 (no novo milénio), habituamo-nos a lidar com temas sensíveis, como a homossexualidade. Obviamente que o preconceito não desapareceu, mas acho que vivemos numa sociedade mais aberta e tolerante. No entanto, quando pego numa revista destas vejo que não percorremos um caminho tão longo como era de esperar, em determinadas matérias nem saímos do sítio.
Já na década de 90 os temas considerados mais polémicos eram abordados de forma extensiva e de uma forma que hoje não vemos em lado nenhum.
Não existe qualquer série de BD americana ou filme que aborde de forma tão sensível e intensa o assunto da morte e sobre a homossexualidade… bem, digamos que há muito que se pode dizer sobre a tolerância a este tema.
Outro aspecto relevante é a forma destemida como Gaiman aborda qualquer assunto. Ele trabalha qualquer assunto e enquadra-o na sua história de forma que cada revista tenha vários níveis de leitura. Existe uma componente intelectual muito vincada e relevante que obriga o leitor a pensar sobre os temas abordados.
(não há volta a dar: se és burro, isto não é para ti)
Os desenhos e as cores desta série são datados, já não se desenha nem se colora daquela forma, mas em nenhum momento nos podemos queixar disso, afinal de contas são grandes os nomes que desenham e dão cor às páginas destas revistas (Dave McKean, Sam Kieth, Mike Dringenberg, Malcolm Jones III, Kelley Jones, Jill Thompson, Marc Hempel, Michael Zulli, Charles Vess). Quando muito podemos aprender com alguns mestres e apreciar aquilo que já era possível fazer há mais de 20 anos, sem recurso a computadores e a programas de desenho.
Não quero dar a ideia de que os desenhos não estão à altura da mestria de Gaiman. Em todas as revistas que li, a arte foi sempre excepcional. Como Morpheus é o Senhor dos Sonhos, e não tem uma forma física definida, tem sido surpreendente a forma como os diferentes artistas o imaginam e como ele se veste e movimenta em cada painel.
Em algumas situações há algo de teatral na forma como ele aparece.
Há muito mais que se pode dizer deste Obra-prima. Não é por acaso que estão previstos 4 volumes de edições anotadas desta obra. Sim 4 volumes! Até agora apenas foram lançados 2, e por isto se constata que a Obra tem uma profundidade rara na Banda Desenhada Americana.
Como não quero prolongar muito mais este texto, aguardo a colaboração dos apaixonados por Sandman.
E tu já leste alguma revista desta série?
Partilha connosco a tua opinião!
Nota: Se tiverem alguma dúvida sobre se devem ou não ler esta série, sugiro que leiam a revista #18, cujo subtítulo é A Dream of a Thousand Cats. Se não gostarem, podem vir aqui insultar o “crítico” que vos fez perder tempo.
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Co-criador e administrador do Central Comics desde 2001. É também legendador e paginador de banda desenhada, e ocasionalmente argumentista.
Curioso… O “A Midsummer Night’s Dream” é das minhas revistas preferidas e penso que a mais premiada do Sandman (tem um World Fantasy Award para ficção curta, a única BD a alguma vez o ganhar). Mas pronto, a cada um os seus gostos, né?
De qualquer maneira, concordo em geral com o artigo, e gostava, já que falaste nos temas, de explicitar o que é o tema principal do The Sandman desde muito cedo (praticamente desde que a revista estabilizou em termos narrativos, depois daquele começo algo acidentado cheio de cameos e “convidados especiais” do universo DC nos primeiros números), que é a mudança. No fim de contas, toda a revista é uma espécie de reflexão (ou várias) sobre a mudança e a capacidade das pessoas de mudarem (ou não).
De qualquer maneira, junto-me ao pessoal que está impaciente a aguardar isto! 😀
Dos meus livros predilectos. E o “A Midsummer Night’s Dream” foi tal e qual como o António Matos disse, até tenho ideia que alguns escritores quiseram proibir a BD de participar mais no concurso, foi um momento histórico. Mas pelo que percebi o teu desgosto prende-se mais com a linguagem usada, mas que aqui faz todo o sentido e vale a pena o esforço, mas ainda não te despeças do Shakespear 😛
Quanto à mudança é sem dúvida um dos maiores temas senão “o” tema. Logo no primeiro número o tempo que ele está preso modifica-o de uma forma que ele só se apercebe nas acções futuras. Impressionante este trabalho e como tudo está tão bem construido e interligado.
Sandman – overture está obviamente já reservado com não sei quantos meses de antecedêcnia :d
Olá António Matos.
O único problema da revista “A Midsummer Night’s Dream” está relacionado apenas com o tipo de inglês (antigo) que é usado, que torna a leitura difícil.
Mas a qualidade é inegável e, como dizes, ganhou vários prémios
Como não vivi os primeiros anos de edição mensal (que inveja de quem viveu) :), não sei se houveram problemas editoriais, mas passado este tempo parece-me que o primeiro trade (Preludes & Nocturnes) funciona muito bem e tudo se encaixa na perfeição.
Desde que escrevi esta crónica já li mais algumas revistas e na minha opinião as historias escritas em arco são melhores que os single issues. Talvez seja um gosto mais meu, pq realmente aprecio mais os livros em que o autor tem mais tempo e espaço para dar corpo ás sias ideias.
Relativamente à prequela devo revelar uma preocupação relacionada com os desenhos. O J.H. Williams III tem o hábito de usar muito o vermelho, e pelas páginas que vi, vai manter o estilo (não seria de esperar outra coisa). Mas não estou a ver bem como o estilo dele se enquadra nesta personagem.
Enfim, mais um detalhe para aguçar a curiosidade 🙂
Pá, penso que não houve problemas editoriais, mas é inegável que o tom das histórias iniciais é muito diferente em relação ao resto, tanto no tom (é mais terror e menos fantasia) como no elenco (tem muito mais ligações directas ao mainstream da DC), e só com o “The Sound of Her Wings” é que o Gaiman começa a escrever o tipo de coisa que acabamos por associar ao Sandman. Dito isto, não deixam de ser muito razoáveis (pessoalmente, gosto da “24 Hours”).
Em relação ao arco versus single issues: o arco principal é realmente muito forte, mas também o são alguns dos single issues (como o Dream of a Thousand Cats e o a Midsummer Night’s Dream de que falaste e o Ramadan, por exemplo). Enfim, há de tudo, menos histórias medíocres 🙂
Eu tenho boas expectativas em relação ao JH Williams III, mas a verdade é que sou fã do homem. De qualquer maneira, não duvido que vá fazer um bom trabalho: é olhares para a diversidade de artistas que a revista teve (ainda mais se contares coisas posteriores, como a Endless Nights) e que praticamente nenhum fez mau trabalho (que me lembre, pelo menos)!