Análise jogos: Like no Other: The Legend of the Twin Books / Whateverland
Vamos partir à aventura de rato na mão: Like no Other: The Legend of the Twin Books e Whateverland são duas propostas de jogos de puzzle para PC que prometem encher-nos o coração.
Seja por nostalgia, vontade de voltar a dar vida a um género moribundo, ou pura teimosia, os jogos de aventura point n’ click parecem estar a ressurgir no horizonte. Embora já tenham existido várias tentativas falhadas e este seja um regresso ainda tímido, espaçado e recebido com um misto de críticas e entusiasmo, não existem dúvidas de que há alguns títulos que vale a pena visitar, e o Central Comics decidiu começar por espreitar três: Like no Other: The Legend of the Twin Books, Whateverland e Return to Monkey Island. (Não se preocupem, não há nenhuma gralha — Return to Monkey Island não está incluído neste artigo porque é um título muito especial para mim e decidi dedicar-lhe um espaço próprio).
Vamos a isto!
Like no Other: The Legend of the Twin Books
Nunca é tarde demais para partir à aventura!
Após um misterioso e devastador terramoto, a cidade de Red Pines é evacuada. Segundo a lenda, o museu local albergava um livro de valor incalculável, mas, para o proteger, foi feita uma cópia perfeita para exibir ao público. Durante o caos da partida apressada, a cópia é salva e o livro original fica para trás. Ao saber disto, Dan, um homem cujo espírito de aventura consegue ser ainda mais avançado que a sua idade, decide deixar tudo para trás para tentar recuperar a relíquia.
Like no Other: The Legend of the Twin Books foi criado pela Actoon Studio, que o lançou no passado dia 25 de agosto.
A premissa do jogo começa por prometer. Aliada à bonita arte, parece ter tudo para ser um êxito junto dos fãs de point n’ click à primeira vista… até jogarmos durante 15 minutos. Like no Other: The Legend of the Twin Books é um curto jogo de puzzle que lava os olhos, mas falha em vários elementos cruciais do género.
Embora até tenha sentido alguma empatia e carinho pelo personagem principal, Dan, a história não se desenvolve muito mais do que descrevi acima, é completamente linear, e nunca percebemos muito bem porque é que ele faz o que faz. Escrevi personagem principal? Talvez apenas “o personagem” seja mais objetivo. Há mais um ou dois intervenientes no jogo, mas não integram propriamente a experiência e servem mais de bibelôs do que outra coisa qualquer. Resumindo, na minha humilde opinião, Like no Other: The Legend of the Twin Books chumba nas categorias história e personagens.
Um pouco relacionadas com o parágrafo acima, temos as categorias de voice acting e diálogos. Não sendo maus, também não são os melhores. Senti que poderiam ter bem mais humor e profundidade. Sendo esta última uma categoria imprescindível neste género, permitam-me que fale da tradução do jogo: o conteúdo do jogo está localizado em português do Brasil — há uma ou duas ocasiões em que teria seguido outras opções, mas nada de sério a apontar. A tradução é fiel ao texto de partida e não se perde nada pelo caminho.
A jogabilidade também não me impressionou. “É um point n’ click, a jogabilidade não interessa” — discordo! Concedo que não é o mais importante, e que se tivermos uma boa história, bons puzzles e bons diálogos, isto pode ser ultrapassado. Mas há sempre espaço para inovar, e aqui, esse espaço não foi aproveitado. A mecânica é a mesma de outros ‘milhentos’ jogos e parece mais pensada para um jogo móvel do que para PC. Também há o facto de que as ações se tornam repetitivas sem necessidade. Como espécie de missão paralela, existem uns artigos chamados “cache” espalhados pelo mapa, que podemos colecionar para conseguir proezas no Steam. É um toque até divertido, mas irrelevante para progredir na história. Enfim, não é um jogo terrível de se jogar, mas também não é a experiência mais divertida.
Falemos então dos puzzles: vira o disco e toca o mesmo. Este é um jogo muito fácil, em que nos é dito o que temos de fazer e, muitas vezes, praticamente como o fazer. A sensação de recompensa não me satisfez muito e estava mais a passar o tempo distraído a pensar no próximo jogo que ia jogar do que propriamente concentrado nos puzzles deste jogo.
Os gráficos e o som de Like no Other: The Legend of the Twin Books são acima da média e são claramente o aspeto mais positivo do jogo. Os desenhos são bons, o mundo atrai e o som entretém. Muito bom.
No que toca aos aspetos centrais dos jogos de aventura point n’ click — história, diálogos e puzzle — Like no Other: The Legend of the Twin Books esteve longe de me convencer… muito longe!
Classificação: 4,5/10
Pode parecer que esta seja uma análise durinha — demasiado até para a nota que dou. Parece estranho, mas até nem odiei a experiência de jogar Like no Other: The Legend of the Twin Books. Só penso que há demasiados aspetos negativos e talvez esperasse mais pela expetativa que o jogo me criou antes de o jogar. Vejam por este ponto, caso o preço do jogo fosse de 1 € a 3 €, talvez a minha perspetiva fosse diferente. Se fosse grátis, até daria uma boa nota! Mas não é. Pagamos 12,49 € no Steam por cerca de 3 horas de conteúdo. É muito por tão pouco. Aposto um dedo mindinho (não necessariamente o meu) em como não tardaremos a ver promoções na ordem dos 80% e acima. Basta esperar até lá!
Para terminar, fica a dica indispensável: às vezes, aquilo que parece demasiado simples, é mesmo só muito simples!
Trailer Like no Other: The Legend of the Twin Books:
Whateverland
Um mundo obscuro, mas cheio de cor!
O ladrão Vincent decide roubar a casa de Beatrice. O que ele não sabe é que a dona da mansão é uma poderosa, vingativa e cruel feiticeira que o envia para um mundo que serve de prisão das almas que ela condena, Whateverland. Aqui, as pessoas assumem as formas que mais se relacionam com quem são, seja de pássaro, fantasma ou gato. Encurralado e confuso, Vincent não tem outra opção a não ser fugir. Mas como? Ao vestirmos a pele do protagonista, temos de decidir escapar ao sermos bons meninos e fazer o que nos dizem, ou ao enganarmos os carismáticos personagens que vamos conhecendo pelo caminho que nós próprios decidimos seguir.
Whateverland é um jogo de aventura point n’ click não linear desenvolvido pela Caligari Games e distribuído pela Caligari Games em associação com a WhisperGames, lançado a 15 de setembro de 2022.
Se Tim Burton desenvolvesse um point ‘n click, seria muito parecido com este. As influências de Whateverland são evidentes, mas será que foram bem aplicadas e, mais importante ainda, será que funcionam?
Em Whateverland, vestimos a pele de Vincent, um ladrão com uma bússola moral duvidosa. Quando tentamos assaltar a casa de uma senhora que se revela uma poderosa bruxa, acabamos enviados para um universo paralelo criado pela feiticeira. Encurralados, temos pela frente a tarefa de escapar e cabe-nos decidir se exploramos o nosso lado honesto ou o nosso lado menos honesto, sendo que a história se desenrola consoante as nossas escolhas. Logo ao início, conhecemos Nikolai (ou Nick), um carismático personagem que nos acompanha e ajuda durante a nossa aventura, mas, pelo caminho, conhecemos muitos outros personagens que marcam a nossa viagem num mundo que nos maravilha com a sua arte.
A história de Whateverland faz sentido, é interessante e está bem pensada. Começamos sem grandes informações mas o enredo vai-se desenrolando e o mistério dissipando à medida que vamos avançando no jogo e conhecendo mais NPC que veneram ou desprezam Beatrice, a bruxa vingativa. É uma história que me despertou e manteve o interesse, repleta de influências, é verdade, mas sem deixar de ser original.
Os diálogos estão bem escritos, mas mereciam um pouco mais de atenção, na minha opinião, chegando até a conter redundâncias que afetam a experiência e quase parecem bugs, dou-vos um exemplo (não é spoiler): no prólogo, para libertarmos Nick, temos de pedir a um cientista louco que abra um armário. Este cientista precisa de um leme, que temos de obter de um corvo. Ao dizermos ao cientista que é o corvo que tem o leme, o velhote ‘casca’ a valer no corvo, dizendo que já sabia que só podia ser ele e chamando-lhe poeta falhado, e percebe-se que ambos são uma espécie de rivais. Ora, quando obtemos o leme do corvo e o entregamos ao cientista, este fica muito surpreendido e não faz ideia de onde ou como conseguimos a peça, como se tivesse acabado de ter uma crise repentina de amnésia e o nosso último diálogo não tivesse acontecido. Não é nada de grave, já sei, mas, para mim, estas ocorrências (não foi a única) quebram um pouco a imersão e afetam a experiência. Os diálogos também tentam ser humorísticos, mas não me conseguiram fazer mais que esboçar um leve sorriso numas piadas, e noutras simplesmente pensar “Epá… não”. Neste campo, há que referir ainda que não existem legendas disponíveis para português.
Quanto a voice acting, aconteceu-me uma coisa estranha: comecei por torcer imediatamente o nariz ao carregado sotaque dos atores. Fez-me mesmo muita impressão e comecei por detestar. Mas o tempo foi passando, fui-me habituando e, por incrível que pareça, até comecei a gostar! Os atores são bons, as falas são muito bem executadas e, o que à partida diria ser um aspeto negativo do jogo, passei a encarar como um aspeto positivo.
Os gráficos e os sons são excelentes, quase geniais. Para mim, a arte deste jogo é excecional. Como começo por dizer, as influências são óbvias (Burton, Don’t Starve), mas criar com influências não é imitar, e não há nada de errado com a primeira. Na minha opinião, o universo de Whateverland traduz na perfeição o ambiente que o jogo pretende criar. Cores, saturação, caracterizações, tudo: cinco estrelas! Não me admiraria que Whateverland viesse a receber algum tipo de distinção pela sua arte. Do melhor que vi nos últimos tempos. E o som não fica atrás! A banda sonora é incrível e acompanha o ambiente ao ritmo certo. É uma obra de arte pluridimensional!
No que toca à jogabilidade, destaco um aspeto positivo e um negativo. Do lado negativo, a forma como interagimos com o mundo não me convenceu. Podemos ver todos os objetos com os quais podemos interagir e ao clicarmos num, abre-se uma espécie de menu ao estilo consola para decidirmos qual é a interação que queremos — não me convenceu e achei que complicou a fluidez do jogo desnecessariamente. Do lado positivo, achei a mecânica de boas ações vs. más ações muito interessante e dá alguma repetibilidade ao jogo, sendo que podemos tentar novamente ao seguir um caminho diferente.
Os puzzles são medianos. São relativamente fáceis, mas o jogo também não nos dá a mão por aí além. Diverti-me a resolver alguns quebra-cabeças e os minijogos são, sem dúvida, engraçados. É difícil pensar no que mudaria sem afetar o resto da experiência, mas penso que o jogo não perderia se os puzzles fossem um pouco mais desafiantes.
O aspeto que mais se destaca em Whateverland é, sem margem para dúvidas, a arte. Para mim, é um dos melhores jogos neste campo, se não o melhor, em 2022.
Nenhum dos outros aspetos de Whateverland me impressionou muito, sendo que os diálogos e os bugs subtraem a maior parte dos pontos à classificação final do jogo.
Classificação: 7/10
É pena que o resto do jogo não acompanhe o nível da arte. É uma oportunidade perdida para ter uma obra-prima a entrar para o Hall of Fame dos point n’ click, ao lado de títulos como The secret of Monkey Island, Indiana Jones and the Fate of Atlantis, Grim Fandango, Machinarium, e outros. Dispa-se Whateverland da sua arte e ficamos com um jogo mediano. Não é que seja tudo horrível — a história é boa e os puzzles não são maus — mas está tudo num nível muito inferior à arte, num patamar… lá está, mediano. 19,99 € no Steam parece-me um bocadinho no limite do aceitável (diria entre 15 € a 20 €), mas tendo em conta a repetibilidade oferecida, não me parece totalmente descabido, visto que podemos conseguir até mais de 20 horas de conteúdo.
Para terminar, fica a dica indispensável: há mais que uma forma de se ser bonzinho!
Trailer Whateverland:
Gamer inveterado que não dispensa uma boa série e nunca diz ‘não’ a uma sessão de cinema… Com pipocas, se faz favor!