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Análise BD: IMAGENS DE UMA REVOLUÇÃO – 25 DE ABRIL E A BANDA DESENHADA

A descoberta da liberdade pela BD portuguesa – Imagens de uma revolução: 25 de Abril e a Banda Desenhada. Fica aqui a análise.

No livro “A Terceira Vaga: Democratização no final do século XX”, Samuel Huntington afirma que foi a Revolução de 25 de Abril de 1974 que iniciou a terceira vaga de democratização da Europa, que chegaria à União Soviética e a todo o Leste Europeu, levando em 1989, à queda do Muro de Berlim, e que continuou pela América Latina e África.

Por aqui se vê a importância deste momento histórico do nosso país, e como não poderia deixar de ser, a Banda Desenhada foi um espelho de toda a agitação, descoberta, alegria, união e divisão de um período vivido de forma apaixonada por todo um povo que esteve amordaçado por quase meio século. Num país em que um quarto das pessoas eram analfabetas, a Banda Desenhada era uma forma de mais facilmente chamar a atenção e passar as mensagens a uma população em quase total descoberta de tudo. E é todo esse movimento de descoberta e total liberdade na transmissão das mensagens que os autores e leitores viveram, que urge registar e que este livro nos dá a conhecer.

Na verdade este livro é o resultado de uma junção e atualização de dois catálogos de exposições de BD. O da “Uma Revolução Desenhada – O 25 de Abril e a BD” que decorreu entre Coimbra e Lisboa em Abril e Maio de 1999, integrada nas comemorações dos 25 anos do 25 de Abril e do catálogo da exposição “BD’s de Abril: O 25 de Abril 30 anos depois”, que decorreu na Amadora entre Abril e Julho de 2004.

Esta é uma obra que diria fundamental, atendendo que o 25 de Abril de 1974 foi uma data que mexeu com toda a sociedade portuguesa. No caso da Banda Desenhada, que estava sujeita à Comissão de Censura (vulgarmente designada por “Lápis Azul”), a conquista da total liberdade de temas e imagens fez explodir a produção e divulgação de todo o tipo de trabalhos, de qualidade totalmente variável. Importava pois editar uma obra para memória futura, onde se fizesse uma recolha e estudo do diverso material obtido nessa altura, divulgando esse legado de forma sistematizada, não só a produção centrada no tema da Revolução, mas também nos temas associados, como sejam a Guerra Colonial, a luta de classes, a liberdade conquistada, as memórias dos períodos clandestinos, etc. É evidente que para esta recolha e estudo foi fundamental o trabalho do Centro de Documentação 25 de Abril, do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e da Bedeteca de Lisboa. Não me parece que João Lameiras e Ramalho Santos, na altura com 8 anos, se preocupassem em fazer arquivo histórico dos fanzines editados, e João Paiva Boléo que na altura tinha 22, andaria muito provavelmente a colar cartazes pelas ruas, que era uma atividade muito comum nesses tempos…

Vários dos fanzines publicados nessa altura tornaram-se conhecidos do público através da divulgação que Vasco Granja fazia principalmente na revista TINTIN, o que deve ter sido uma boa ajuda na recolha de elementos. Por isso é curioso que da primeira versão para a atual, uma extensa lista de agradecimentos tenha desaparecido, numa obra que basicamente se manteve igual. Na obra inicial eram também lançados vários desafios, como por exemplo a criação de um acervo e a tentativa da descoberta dos autores não identificados em vários dos trabalhos, para escrever uma história mais completa desse período.

Mas aí é que surge o maior problema deste livro. Sendo uma co-edição entre A SEITA e a LEVOIR, com o apoio do jornal PÚBLICO e cofinanciada no âmbito do programa PORTUGAL 2020, esperava um livro que não fosse apenas uma junção de dois catálogos com algumas atualizações, mas sim uma obra mais sistematizada, melhorada e desenvolvida. Esperava novas abordagens e análises, que naturalmente 23 anos depois deveriam ser diferentes. O livro começa por uma introdução que foi atualizada, depois tem um miolo que é basicamente o mesmo do catálogo inicial, também com algumas atualizações mas com bastantes menos reproduções gráficas e um último capítulo com origem no catálogo de 2004, também atualizado e que diz respeito a obras mais recentes sobre os temas referidos nos capítulos anteriores. Para além disso a leitura do livro não é homogénea, dando a impressão que cada autor escreveu um ou mais capítulos e depois se limitaram a juntar os textos.

Um dos temas abordados é a revista VISÃO que tem um pequeno capítulo que lhe é dedicada. Porém creio que já se justificava uma análise bem mais profunda sobre esta publicação, que teve na altura uma grande influência na alteração da leitura da banda desenhada nos leitores portugueses. A recolha do depoimento dos vários autores a ela ligados, seriam fundamentais para compreender a publicação e o seu enquadramento no período revolucionário.

Apesar de alguma desilusão, e não havendo alternativa, continuo a achar que é uma obra fundamental em qualquer biblioteca de Banda Desenhada portuguesa, ao retratar um capítulo tão rico e intenso das publicações em Portugal. Tenho esperança que uma próxima edição, seja efetivamente revista, melhorada e aumentada.

A dinâmica de leitura apesar de variável é aceitável, conseguindo manter um nível suficiente para uma leitura contínua e interessante

Livro em capa dura com excelente encadernação, com páginas em papel brilhante de boa qualidade, com boa impressão e letra em tamanho adequado para fácil leitura. Bom preço para o tipo e qualidade geral do livro.

Tempo de leitura:

  • Imagens de uma revolução – 25 de Abril e a Banda Desenhada – aproximadamente 2:45 Horas

Um livro fundamental para quem gosta de estudar a Banda Desenhada em geral e a portuguesa em particular. Espero que as próximas edições sejam bastante melhoradas. Espero também que aproveitem para lançar em 2024 um livro que junte “As Visões de Abril” dos 25 anos com umas novas “Visões de Abril” dos 50 anos que venham a ser criadas. Seria muito interessante.

Imagens de uma Revolução: O 25 de Abril e a BD

IMAGENS DE UMA REVOLUÇÃO – 25 DE ABRIL E A BANDA DESENHADA

João Miguel Lameiras, João Paulo Paiva Boléo, João Ramalho-Santos

Editora: A Seita / Levoir

Livro em capa dura com 152 páginas nas dimensões de 19 x 27 cm

PVP: 17,90 €

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